DORITA

 

REVISTA MANCHETE

LIVRO EXORCIZA A SAUDADE DO INESQUECÍVEL ZÓZIMO

ROMANCE ETERNO

APAIXONADA, ELA AJUDOU ZÓZIMO A SUPERAR O ALCOOLISMO E O CASAMENTO DE 14 ANOS SÓ FOI INTERROMPIDO PELA MORTE. R

EENCARNAÇÃO

ORIENTADO PELA TERAPEUTA CARMEN VIANA, O CASAL REVIVEU MOMENTOS DRAMÁTICOS DE SUAS VIDAS PASSADAS.

ÚLTIMOS MOMENTOS

VÍTIMA DE UM TUMOR FULMINANTE DISSE, POUCO ANTES DE MORRER: “GOSTARIA DE CONHECER MEU ANJO DE GUARDA”.

CARMEN ZAMORA

NILTON RICARDO









A saudade do jornalista Zózimo Barrozo do Amaral está tão presente na vida de Dorita Moraes Barros, sua mulher por 14 anos, que ela precisou escrever um livro para exorcizar este sentimento. Quem sai ganhando são os admiradores do estilo sagaz do colunista carioca, muito influente no Jornal do Brasil nas décadas de 70 e 80 e que em 1993, levou sua genialidade para o jornal O Globo. Lá, trabalhou até a morte, aos 56 anos, vítima de câncer no cérebro, em novembro de 97.

O livro de Dorita, Relatos de Uma Alma, conta os últimos dias de Zózimo no Hospital Mount Sinai, em Miami e revela que ele enfrentou a morte sem arrependimento ou amargura.

Relatos de Uma Alma também descreve a vida pouco convencional de Dorita, que viveu intensamente os anos 60 e 70, dividindo seu tempo entre Paris e Marbella, na Espanha. Antes de Zózimo, ela teve dois casamentos, um deles com o ex-guerrilheiro anticastrista Carlos Verdeja, pai de seus filhos Marco Santiago, 23 anos e Gabriela, 21. Descendentes de uma família paulista quatrocentona, Dorita dirige uma empresa de plantas artifíciais. Bela e elegante aos 56 anos, desconversa quando o assunto é um novo romance. “Não planejo nada, quero é estar bem hoje e continuar seguindo meu caminho espiritual.”

No apartamento duplex, em frente à Lagoa Rodrigo de Freitas, na Zona Sul do Rio, Dorita e Zózimo viviam uma agitada rotina de festas e badalações.

– Ao contrário de Zózimo, a senhora não tinha experiência em jornalismo ou literatura. Foi muito difícil escrever Relatos de Uma Alma?

“Este foi um livro mágico. Tenho a sensação de que o escrevi em cinco minutos. Os textos foram quase psicografados. Já surgiram mais ou menos prontos, bastava canalizar e escrever. Mas depois eu me sentia derrubada, sem energias. Precisei também pesquisar mais sobre a vida do Zózimo antes do nosso casamento. Mas tudo foi fluindo. O livro foi um prazer, uma grande emoção.

– No livro, a senhora conta aventuras em vários lugares do mundo, antes de conhecer o Zózimo. Foi uma juventude típica dos anos 60?

“Foi muito agitada, típica da minha geração. Sempre fui uma andarilha. Em uma de minhas viagens mais interessantes, fui parar no quartel-general dos Hell’s Angels, em Nova York. Por incrível que pareça, consegui conviver com aqueles homens que são quase marginais, truculentos e machistas. Nas minhas viagens aprendi a não julgar, porque quando você julga, o universo fica muito pequeno. Um bandido pode ter muita sabedoria.”

– Zózimo e a senhora tiveram um relacionamento intenso, de 1983 à 1997. Foi um casamento feliz?

“Sem dúvida. A riqueza do nosso casamento era cada um manter a sua identidade. Eu nunca parei de trabalhar. Zózimo ficava o dia inteiro na redação, descobrindo coisas e juntando material para a coluna. Quando nos encontrávamos, um tinha muitas novidades para contar ao outro. Era sempre uma festa vê-lo chegar em casa.”

– Um dos momentos emocionantes do livro é quando a senhora conta a luta de Zózimo para parar de beber. Chegou a duvidar se ele conseguiria controlar o alcoolismo?

“Levou muito tempo até que eu entendesse que, para ele, aquilo era uma doença e que faz parte desta doença a pessoa achar que vai dominar a situação, que vai poder lidar com ela sem ajuda. Ele ficava muito bem por algum tempo, depois tinha recaídas e voltava a beber muito. Ficamos separados por três meses, eu aqui, ele num apartamento no Arpoador. Não era uma separação total, porque existia uma paixão muito grande entre nós. Ele realmente só se libertou da doença quando teve uma experiência cósmica muito bonita, na qual ele viu Deus. Mas isso não posso contar com detalhes, porque foi uma coisa muito íntima dele.”

– A senhora se refere às experiências com a terapeuta Carmen Viana. Acredita que as visões de vidas passadas que tiveram sob orientação dela foram autênticas?

“Gosto muito do trabalho da Carmen. O processo que nós vivemos não é tecnicamente uma regressão. Na regressão, a pessoa é hipnotizada para lembrar de vidas anteriores. O que a Carmen faz é inverter a polaridade dos chacras (pontos fortes de energia do corpo). Esses detalhes são muito específicos, mas, em resumo, é uma pesquisa da memória celular que cada um guarda desde a origem. Através desta pesquisa vivenciei a visão de Cristo sendo morto na cruz e eu perto dele. A visão do Zózimo foi ainda mais extraordinária, mas não posso contar. Pra ele, foi algo muito forte.”

– Como a senhora vive a busca espiritual hoje?

“Costumo dizer que no caminho espiritual eu sempre vou estar no começo do caminho. Estou planejando uma viagem para o Egito com a Carmen Viana, para continuar um trabalho que começamos em 1994 e que foi muito positivo. Mas não me considero mestra de ninguém. “

– Sem o Zózimo, como ficou o jornalismo carioca e o próprio Rio de Janeiro, que ele tanto amava?

“Ele faz muita falta e não deixa herdeiros. O senso de humor, que era sua marca registrada, ninguém pode copiar. Foi embora com ele.”

– A senhora se sente pronta para um novo romance, talvez para casar de novo?

“Não faço planos quanto a isso, só penso em estar bem hoje. Quem já passou por perdas sabe que não dá para planejar tudo na vida. Afinal, pouco antes do Zózimo morrer, nós estávamos no Nepal, viajando em cima de um elefante! Nunca fui uma viúva chorosa. A tristeza não interfere na minha vida. Não vou ficar em casa deprimida, com saudades.”

“Lembrando Zózimo rodopiar naquela cadeira, ainda posso ouvir, ecoando como um canto distante, nosso lema bem humorado de todos os momentos: amor, deixa fluir… Quando dava-se conta da falta de controle, já a depressão havia se instalado (…) Na redação, a equipe estava preparada para cobrir sua ausência.”

“Perguntei como se sentia. Quer saber? Não tenho medo nenhum, nenhum… Deus tem sido tão generoso comigo, que só me resta dizer muito obrigado’.”